Eu posso ser da família de Jesus

Rubens Rodrigues*

A compreensão que com certeza temos a respeito de uma família é daquela constituída de uma ligação genética entre seus membros. Uma família cujo homem e a mulher, por meio do conhecimento que têm um do outro se unem em matrimônio e passam assim a constituir um só corpo e uma só carne. Quanto à família de Jesus, Ele não a limitou apenas à sua constituição genética, Ele abriu-nos a possibilidade de uma pertença familiar a Ele.

Podemos entender esses aspectos quando Jesus impelido por alguém que o evangelho não esclarece quem, O diz: “Eis que Tua mãe, Teus irmãos, e Tuas irmãs estão lá fora e Te procuram”. Jesus posteriormente questiona: “Quem é minha mãe e meus irmãos?” E, repassando posteriormente o olhar sobre os que estavam com ele, disse: “Eis a minha mãe e os meus irmãos. Quem fizer a vontade de Deus, esse é meu irmão, irmã e mãe” (cf. Mc 3, 31-35).

O versículo 35 dessa passagem do Evangelho de Marcos é sem sombra de dúvidas o cerne da questão que nos propomos trabalhar. Fazer a vontade de Deus é, pois, o critério base para a pertença à família de Jesus e abre-nos à mente uma pergunta, ou seja: será que fora do cristianismo há possibilidade de pertença a Família de Cristo?

Para responder tal pergunta é necessário ver que há em pessoas que professam outros credos e/ou que muitas vezes nunca ouviram falar em Jesus, que praticam muito daquilo que é ético ao cristianismo e que rege toda a sua especulação moral e que se verificam em seus mandamentos. Por exemplo: amar o próximo, defender-lhe a vida, honrar por seus direitos… Esses são pontos fundamentais de quem se diz cristão e quem os pratica está com certeza estabelecendo sua adoção na fraternidade cristã.

A Igreja Católica passou a entender que: “…todas as pessoas que, sem culpa própria, desconhecem a Cristo e a Sua Igreja, mas buscam Deus de coração sincero e seguem a voz da própria consciência, alcançam a salvação eterna. Quem, porém, sabe que Jesus Cristo é ‘o Caminho, a Verdade e a Vida’, mas não o quer seguir, não encontrará a salvação em outros caminhos” (Youcat, 136).

Essa compreensão é muito útil para decifrarmos que não se pode particularizar a pertença a Cristo e a sua família. Que pertencer a sua família é um mérito e não uma escolha pessoal que se faz simplesmente por interesse de alcançar a salvação e que se estabelece apenas como cumprimento de ritos costumeiros.

Outra exortação de Jesus é importantíssima para revelar quem cabe à sua família, a nação que por Ele será escolhida para pertencer a Sua morada. Essa é a passagem em que Jesus fala a respeito do ultimo julgamento: “Quando o filho do homem vier em sua glória, e todos os anjos com Ele, então se assentará no trono da glória. E serão reunidos em sua presença todas as nações e ele separará os homens uns dos outros, como o pastor separa as ovelhas dos bodes, e porá as ovelhas à sua direita e os bodes à sua esquerda. Então dirá: ‘Vinde benditos de meu Pai, recebei por herança o Reino preparado para vós desde a fundação do mundo. Pois tive fome e me destes de comer. Tive sede e me destes de beber. Era forasteiro e me acolhestes. Estive nu e me vestistes, doente e me visitastes, preso e vieste-te ver-me’. Então os justos lhe responderão: ‘Senhor, quando foi que Te vimos com fome e Te alimentamos, com sede e Te demos de beber? Quando foi que Te vimos forasteiro e Te recolhemos ou nu e Te vestimos? Quando foi que Te vimos doente ou preso e fomos Te ver?’ Ao que lhes responderá o Rei: ‘Em verdade vos digo: cada vez que o fizeste a um desses meus irmãos mais pequeninos , a mim o fizestes’. Em seguida dirá aos que a sua esquerda: ‘Apartai-vos de mim, malditos, para o fogo eterno preparado para o diabo e para os seus anjos. Porque tive fome e não me destes de comer. Tive sede e não me destes de beber. Fui forasteiro e não me recolhestes. Estive nu e não me vestistes, doente e preso, e não me visitastes’. Então, também eles responderão: ‘Senhor, quando é que Te vimos com fome ou com sede, forasteiro ou nu, doente ou preso e não Te socorremos?’ E Ele responderá com estas palavras: ‘Em verdade, em verdade eu vos digo: todas as vezes que o deixastes de fazer a um desses mais pequeninos, foi a mim que o deixastes de fazer. E irão eles para o castigo eterno enquanto os justos irão para a vida eterna” (cf. Mt 25, 31-46).

Parece-nos longa demais essa passagem, mas sem ela não poderíamos compreender de fato que não basta professar uma fé em Cristo, antes disso é necessário amá-lo e perceber que ele se faz presença no outro, é na constituição deste altruísmo que se vivifica a família de Jesus. Pois é este outro que dá-nos a possibilidade da contemplação de Cristo na Terra.

A família de Jesus, portanto, é constituída de crentes e não crentes, de pessoas que mesmo em seus diversos atos de fé, manifestam um amor fraterno por àqueles que o próprio Jesus se entregou na Cruz. E talvez seja isso que esteja faltando, pode ser que estejamos envolvidos de toda a palavra e não a coloquemos na vida prática, pode ser que estejamos superlotados de conhecimento e este ainda não tenha se manifestado em ação. Eis, portanto a hora de começarmos a estabelecer-nos como irmãos de Cristo, constituintes dessa enorme família.

* Aluno do curso de filosofia da Faculdade Católica de Fortaleza e Seminarista da diocese de Crateús – CE

Postado por