Menino Jesus versus Papai Noel

Pe. Alfredo J. Gonçalves, cs

– Olá, Menino Jesus, tenho a impressão que preferes o silêncio ao clima dos festejos. E no entanto, és tu a razão de todo esse vaivém! Afinal de contas, o que está acontecendo? As pessoas olham para ti com um ar de mistério, mas, ao mesmo tempo, não parecem muito interessadas em falar contigo.

– Por enquanto, Sr. Papai Noel, não podes entender. Mais tarde talvez te seja permitido penetrar o que chamas de mistério. Então verás que meu reino, embora comece neste mundo, não é deste mundo!

– Que queres dizer com isso? É neste mundo que nos movemos: não vês o fascínio das luzes, das cores, da música, do brilho nos olhos das pessoas frente aos atrativos que a loja oferece! Certo que és apenas um recém-nascido, mas tens de abrir os olhos aos apelos que nos cercam de todos os lados.

– Apesar de recém-nascido, bem sei o que pensas. Vês tudo com os olhos do mercado e das férreas leis de lucro e acúmulo de capital. O marketing, a propaganda e a publicidade te deixaram míope ou cego. Ofuscaram o sentido oculto por trás de tanto rumor e tanta correria.

– Mas que sentido oculto? A vida está aí para ser vivida. Olha a montanha de panetones, os vinhos, os produtos importados, os jogos eletrônicos… E tantas outras coisas próprias das festas de final de ano. Olha o riso largo, o peito aberto e a despreocupação no olhar e no rosto das crianças e jovens, dos adultos e idosos? As famílias se reencontram.

– Reencontro? Toda essa euforia, em grande parte, não passa de aparência enganosa. Para além do movimento e da luz, esconde-se um mistério. Desculpe se insisto nesta palavra, mas no interior mesmo dessa atividade vertiginosa existe, sim, um mistério ao mesmo tempo real e invisível.

– Mistério, mistéro, mistério!… Enquanto te revestes com essa roupagem secreta e misteriosa, as crianças me procuram, me sorriem, me abraçam, registram tudo com fotos… E o é mais importante, compram nossas mercadorias e brinquedos… E os pais se mostram felizes com a felicidade dos filhos. Não te dás conta disso! Tu, ao contrário, te escondes aí, como que de escanteio, meio envergonhado. Dir-se-ia que eu tomei teu lugar no presépio, como referência máxima das festividades natalícias!

– Para ser sincero, pergunto-me seriamente o que atrai as pessoas à sedução do brilho que tu representas. Olhando com maior atenção, vejo que muitos buscam dissimular algo, varrer o lixo para debaixo do tapete. A festa é ambígua: pode ser genuína, sem dúvida, mas pode também camuflar ou compensar uma crise, um desencanto profundo, uma falta de sentido consciente ou inconsciente. Não me é difícil surpreender olhares oblíquos, sorrisos forçados, palavras envenenadas.

– Acabas de nascer e já vens com a mania de filosofar. Deixa as pessoas se divertirem enquanto é tempo. Depois vem janeiro, dívidas, contas a pagar… Menos mal que o carnaval está às portas!

– Justamento isso me preocupa. A alegria que circula e se respira neste ambiente festivo parece ter um carárer superficial e passageiro, transitório e efêmero. Por trás de olhares e rostos aparentemente luminosos, é possível identificar pontos obscuros e obtusos, até mesmo desesperados. Há perguntas sobre a existência que brotam de corações feridos, de almas angustiadas. Perguntas sem remédio e sem resposta. Há medos e fugas, becos sem saída. É sobre essa realidade que me concentro.

– Perguntas, perguntas, perguntas! Deixa as perguntas para outro momento!

– Mas são elas – as dúvidas e perguntas, bem como os sonhos, buscas e esperanças – que movem o curso da história. Toda essa corrente frenética não faz mais que deslocar as interrogações de um lado para outro, protelando-as. Minha missão e meu foco é mostrar “o caminho, a verdade e a vida”.

Roma, 7 de dezembro de 2015

Um Comentário

  1. Ivan Tadeu
    dez 08, 2015 @ 00:02:49

    Bom texto esse do “Papai Noel e o Menino Jesus”.