Campanha da Fraternidade debate segurança pública

Gianfranco Graziola, imc

Mais uma vez a Igreja Católica coloca em discussão um tema de atualidade, promovendo para a Quaresma de 2009 o debate em torno da segurança pública.

A centralidade da Campanha da Fraternidade (CF) não está somente no tema, – que já foi tratado de outras maneiras em anos anteriores quando se discutiu o problema da vida e da justiça social, a necessidade de uma sociedade mais justa e mais segura, os problemas no universo do trabalho, as principais questões da realidade brasileira quais sejam, a violência contra a pessoa humana nas suas mais diferentes condições, a terra, a moradia, a comunicação, a política, as drogas, as injustiças, a educação, a saúde, os problemas do meio ambiente, a preservação da água como fonte de vida, a Amazônia – mas, sobretudo, na vontade de fazer, da segurança pública, uma realidade de todas as pessoas e feita por todos, e não apenas para todas as pessoas.

Isso significa que a segurança deve ser fruto da ação justa e solidária de todos, e não apenas tarefa dos órgãos de Estado encarregados da ordem pública, caso contrário ela não existirá. Em função disso, todos somos chamados a trabalhar as relações interpessoais começando dentro de casa, na vizinhança, alcançando as relações de trabalho e as sociopolíticas e culturais, construindo juntos a base para o respeito dos direitos e do gosto de viver em paz.

Mas se esta é uma parte importante do processo, não pode faltar o controle dos cidadãos e cidadãs sobre os governos por eles eleitos para que cumpram e realizem um verdadeiro trabalho “público”.

Deus cuida de todos

Para mostrar a realidade e as causas da insegurança que se apoderam das pessoas, o texto indica algumas situações contraditórias que geram confusão e que fazem parte da vida do dia a dia, como a realidade da comunidade familiar, onde a pessoa se relaciona, cresce, cria amizade, e que devido à sobrevivência e ao trabalho levam cada um a “cuidar mais de si”, deixando que “Deus cuide de todos”, alimentando o medo e a desconfiança, enfraquecendo as relações de parentesco e comunitárias com os relatos de fatos violentos que as rádios e televisões mostram, encenados até dentro das paredes domésticas.

Não menos insignificante é o aspecto da violência que toma conta da sociedade, gerando sentimentos de medo e angústia, favorecendo e instalando um clima de quase guerra, terreno fértil para alguns grupos econômicos, pessoas e países poderem levar adiante as suas atividades ilícitas (narcotraficantes e contrabandistas), favorecendo ao mesmo tempo o desemprego estrutural, que gera instabilidade, mina as formas de organização para a valorização do trabalho e melhora na distribuição da riqueza.

A essas formas de insegurança estrutural se junta a da propriedade da terra, seja no campo ou na cidade, onde a falta de limites e a ausência de políticas públicas acabam favorecendo quem tem dinheiro e poder, passando uma imagem de que os sem-terra e sem-teto são baderneiros e terroristas, fato que a classe média usa como pretexto de insegurança e ameaça.

E como esquecer a discriminação étnica e racial que atinge os Povos Indígenas, os quilombolas e os afrodescendentes. Ao mesmo tempo que se insiste que não há racismo, não se tem nenhum escrúpulo em invadir ou apoiar quem invade seus territórios.

Quem então se beneficiaria deste estado de insegurança? Tudo indica que seriam os que não têm como explicar a origem da riqueza concentrada em suas mãos.

Parece que as pessoas amedrontadas preferem ficar estáticas arcando com os custos de maior repressão aos movimentos que exigem justiça, direitos, mudanças estruturais, novas políticas públicas e com isso os mais abastados se sentem mais livres para controlar ainda mais terras, terrenos, empresas, bancos, lucros, juros, e para garantir que a política econômica governamental continue apostando em suas iniciativas.

A falsa segurança

Não é exagero afirmar que no pensamento da maioria do povo o único “jeito para ter segurança” é aumentar a presença e o armamento da polícia nas ruas para reprimir os “bandidos e ladrões”. Naturalmente isso é facilmente justificável, enquanto é sempre questionado o pouco ou nada que a polícia faz para reprimir os “ladrões do colarinho branco”. Quando isso acontece é tido como exagero e falta de respeito aos direitos das pessoas de bem.

E como ignorar o silêncio da imprensa que, perante dois habeas corpus de um colarinho branco para ser libertado, praticamente nada diz sobre o fato de que metade de todos os presos do Brasil tem direito de responder em liberdade, mas não consegue esse benefício por não ter dinheiro para contratar advogado!

E como não contestar a necessidade da construção de novas cadeias com a exigência de que a Justiça saia de seu pedestal, reconheça e faça valer os direitos iguais e não apenas de alguns, evitando que as mesmas se tornem, devido à mistura dos presos e seus crimes, autênticas escolas do crime e do narcotráfico.

Neste contexto é bom lembrar que em questões de segurança pública, é importante a educação política, e a reflexão sobre a causa da insegurança.

Ao mesmo tempo esse processo contribuiu para uma reeducação das políticas, organizando experiências de “polícia comunitária”, onde desaparece o uso de armas de fogo, usadas apenas em casos extremos, substituídas por armas dissuasivas e onde a solução dos conflitos feita na comunidade tem reforçado a autoestima das pessoas, melhorando a confiança e aumentando o desejo de uma cidadania mais ativa.

Desafios da CF 2009

Estes fatos concretos, como o objetivo da Campanha da Fraternidade, nos levam a entender que o tema e a realidade da segurança pública, em lugar de ser preocupação de segmentos especializados da sociedade e de órgãos governamentais, devem cada vez mais fazer parte do debate e da vida da sociedade.

O desafio maior dessa Campanha é fazer com que a questão seja assumida como tarefa de todo o cidadão e cidadã, das comunidades, organizações, entidades, igrejas e movimentos sociais, que em colaboração com as instituições de governo promovam uma força de segurança pública que defenda os direitos humanos, premissa fundamental para promover a igualdade, ampliar o espaço da cidadania, superar o medo, o ódio, a falta de respeito, e também a lógica da vingança, da agressividade, da tortura e da solução dos conflitos pela própria força.

Para chegar a realizar a meta proposta, a Campanha aponta como inadiável a democratização das forças e órgãos de segurança. Para isso se faz necessária uma mudança na sua lógica de funcionamento mudando o artigo 144, titulo V da Constituição. A realização disso passa também por ações de “prevenção”.

A primeira destina-se a evitar que o crime seja cometido, favorecendo a melhoria das condições e qualidade de vida; a segunda destina-se a reprimir e agir onde o conflito se manifesta. A terceira ação se destina a recuperar, por isso atua junto a todos que foram recolhidos pelo sistema penal e tem a marca da educação e do cuidado para evitar a violência.

A concretização dessas ações e deste plano de segurança pública, que deve ser de qualidade, exige um diagnóstico e estudo da situação, com um acompanhamento constante das ações, e avaliação de seus resultados para corrigir as falhas e melhorar a qualidade do trabalho, favorecendo e ao mesmo tempo garantindo a participação de todos e o alcance dos objetivos propostos.

Fundamental nesse processo é a mudança de pensamento político, deixando de lado o investimento em polícia e presídios para passar a desenvolver condições para o tratamento político dos conflitos sociais, de forma participativa e democrática, comunitária e cidadã, porque: “uma segurança autêntica se alcança somente pelo trabalho com as comunidades, com o fim de proteger todos os seus direitos, combinando uma permanente e respeitosa presença da polícia com uma política de programas de investimento social” (Anistia Internacional).

Enfim como cristãos não podemos esquecer os valores que norteiam a nossa vida, como a justiça, a paz, o amor, a misericórdia, pontos importantes da vida de nosso mestre Jesus.

Nesse sentido, as propostas de mudanças são:

● o modelo social centrado na questão econômica e financeira;

● a injustiça social, a desvalorização da pessoa humana e da sua dignidade, a pobreza, a miséria;

● a fome e a exclusão social;

● a educação de má qualidade;

● os meios de comunicação social que desde a programação infantil passam uma mentalidade de violência e conflito, individualismo e subjetivismo;

Ao mesmo tempo trabalhar:

● o compromisso pessoal e comunitário;

● a busca de um novo modelo penal e a criação, ampliação e aplicação de penas alternativas divulgando e implementando o método da Associação de Proteção e Assistência aos Condenados (APAC);

● a formação e valorização das Comissões de Justiça e Paz e Direitos Humanos localmente e em nível diocesano, crie e reforce as pastorais sociais e particularmente a Pastoral Carcerária para acompanhar a vida dos encarcerados;

● a organização de um mutirão de evangelização e partilha, onde se juntem os esforços de cada um, porque o sucesso e a vitória da CF será construir segurança pública através da participação, da organização e da solidariedade.

Objetivos da CF 2009

“Suscitar o debate sobre a segurança pública e contribuir para a promoção da cultura de paz nas pessoas, na família, na comunidade e na sociedade, a fim de que todos se empenhem efetivamente na construção da justiça social que seja garantia de segurança pública”.

Objetivos específicos:

● desenvolver nas pessoas a capacidade de reconhecer a violência na sua realidade pessoal assumindo sua responsabilidade em relação à violência e à promoção da cultura de paz;

● denunciar os crimes contra a ética na prática da economia e da administração pública;

● fortalecer a ação educativa e evangelizadora que constrói a cultura de paz e aprofunda a consciência de que, rompendo com as visões de guerra se debela a violência;

● denunciar o esquema punitivo presente no sistema penal brasileiro, expressão de vingança, propondo ações verdadeiramente educativas, penas alternativas, fóruns de mediação de conflitos que ajudem na superação dos problemas e na aplicação da Justiça que recupera as pessoas em lugar de condenar e excluir;

● favorecer a criação e articulação de redes sociais populares e políticas públicas que trabalhem a superação da violência e as suas causas, difundindo a cultura de paz;

● desenvolver ações que ajudem a superar as causas da insegurança e tudo o que a provoca;

● animar e organizar ações solidárias em favor das vítimas da violência.

*Mestre em Missiologia atuando em RR.

Um Comentário

  1. ROSEMEIRE FREITAS VIEIRA
    mar 19, 2010 @ 11:50:22

    mande para mim propostas de açoes de melhoria metas. tema : política e Economia.
    Campanha da fraternidade de 2010
    vou fazer um trabalho com meus alunos do Ensino Médio.
    Por favor manda pelo e-mail tudo que estiver de acordo com este tema.
    Aguaro e agradeço, desde já
    ROSE