Não nos desviar do amor

Antonio Pagola de José

O evangelista João coloca nos lábios Jesus um longo discurso de despedida onde são recolhidos com especial intensidade alguns traços fundamentais que deverão ser lembrados pelos seus discípulos ao longo dos tempos, para ser fiéis à sua pessoa e ao seu projeto. O mesmo acontece nos dias de hoje.

“Permanecei no meu amor”. É a primeira coisa. Não se trata só de viver dentro das fronteiras de uma religião, mas viver no amor com que Jesus nos ama, o amor que Ele recebe do Pai. Ser cristão não é, primeiramente, uma questão doutrinal, mas uma questão de amor. Ao longo dos séculos, os discípulos irão conhecer incertezas, conflitos e dificuldades de toda ordem. O importante será sempre não se desviar do amor.

Permanecer no amor de Jesus não é algo teórico ou vazio de conteúdo. Consiste em “guardar seus mandamentos”, que Ele próprio resume imediatamente no mandato do amor fraterno: “O meu mandamento é este: que vos ameis uns aos outros, assim como eu vos amei.” O cristão encontra na sua religião muitos mandamentos. Sua origem, sua natureza e sua importância são diversas e desiguais. Com o passar do tempo, as normas são multiplicadas. Mas só do mandato do amor Jesus diz: “Este mandato é o meu”. Em qualquer época e situação, a coisa decisiva para o cristianismo é não sair do amor fraterno.

Esse mandato do amor não é apresentado por Jesus como uma lei que deve governar nossa vida transformando-a numa vida mais dura e pesada, mas como fonte de alegria: “Disse-vos estas coisas para que a minha alegria esteja em vós, e a vossa alegria seja completa”. Quando o verdadeiro amor vem a faltar entre nós, é criado um vazio que nada nem ninguém podem encher de alegria.

Sem amor não é possível caminhar para um cristianismo mais aberto, cordial, alegre, simples e amável onde possamos viver como “amigos” de Jesus, de acordo com a expressão evangélica. Não iremos saber como gerar a alegria. Mesmo sem querer, iremos continuar cultivando um cristianismo triste, cheio de queixas, ressentimentos, lamentos e desassossego.

Ao nosso cristianismo falta, freqüentemente, a alegria daquilo que é feito e é vivido com amor. Ao nosso seguimento de Jesus Cristo está faltando o entusiasmo da inovação, e lhe sobra a tristeza daquilo que é repetido sem a convicção de estar reproduzindo o que Jesus queria de nós.