Próximas eleições e próximas gerações

Pe. Alfredo J. Gonçalves, CS

Em plena campanha eleitoral e às vésperas do pleito que deverá escolher o presidente da Repύblica, os governadores dos estados, os senadores edeputados federais, estamos num momento oportuno para refletir seriamente sobre a célebre frase do escritor espanhol Noel Clarasό: ”Um polίtico pensa nas prόximas eleições; um estadista nas prόximas gerações”. Traduzida em bom português do Brasil, a frase poderia soar da seguinte maneira: um politiqueiro pensa nas prόximas eleições; um polίtico nas prόximas gerações. Entende-se por “politiqueiro” o canditato de carreira, interessado em utilizar as instâncias do universo relacionado à ação polίtica para manter e/ou conquistar privilégios, sejam estes de ordem pessoal, familiar, corporativa ou pardidária. Polίtico, em contrapartida (e com P maiύsculo, como se costuma dizer), é aquele que se lança no campo da administrção pύblica com a inteção de empenhar-se pela justiça, pela paz e pelo bem comum, o que significa trabalhar pela defesa dos direitos humanos dos que encontram-se mais marginalizadose excluίdos.

Desse modo, nao é difίcil dar-se conta que o primeiro se caracteriza por uma “visão de curto prazo”, de olho nas vantagens imediatas que lhe pode trazer o processo eleitoral, ao passo que o segundo costuma ter uma “visão de médio ou longo prazo”, de olho no que pode ser feito para melhorar as condições reais da populção. Em outras palavras, enquanto um avalia todas as oportunidades (oportunismo) de ganho pessoal, familiar ou partidário que a polίtica pode oferecer , com vistas a enriquecer o prόprio patrimộnio, o outro procura seguir um prorgrama ou projeto estabelecido, no sentido de enriquecer o nίvel de vida do maior nύmero de pessoas, com particular atenção aos extratos de baixa renda.

Seguindo os termos de Clarasό, a “visão curta” do polίtico (politiqueiro) mal alcança o nίvel conjuntural da situação econômica, social, polίtica e cultural do paίs. Navega nas águas superficiais do panorama sociohistόrico, tratando de pescar e acumular o fruto do trabalho da sociedade como um todo. O estadista (Polίtico), pelo contrário, com uma “visão de longo alcance”,mergulha nas águas profundas da realidade. Trata de entender as causas histόricas e estruturais das assimetrias, injustiças e desequilίbrios socioeconômicos, bem como suas implicações e consequências, na tentativa de buscar solução para os problemas reais que se apresentamem um cenário mais amplo.

Muita coisa poderia ainda ser dita, escrita e publicada sobre a postura e o comportamento de um e de outro. Apenas dois aspectos a serem sublinhados. O primeiro é que, da mesma forma que a corrente de um rio corre sempre para o mar, tudo converge para a temática da “ética na polίtica”. São inύmeros os livros, artigos e frases que circulam sobre o assunto, mas poucos os que conseguem efetivamente mudar a prática de “fazer polίtica”. Como diz o velho ditado, “a raposa troca de pelo, mas não troca de vίcio”. Aliás, não é sem razão que os politiqueiros trdicionais costumam ser chamados de raposas. E estas, bem o sabemos, quanto mais velhas, mais espertas na arte de exercer e passar adiante suas manhas. No Brasil (e não sό), as raposas politicas contam com “currais” e “cabos” eleitorais para perpetuar as oligarquias mais obtusas, reacionais e retrόgradas.

O segundo aspecto é mais complexo edelicado: na realidade do cotidiano, polίticos e politiqueiros não se encontram restristos em limites nίtidos e precisos. Bem ao contrário, ambos se mesclam, se confundem e se alternam de forma espantosa. Ao mesmo tempo que podem entrar em rota de colisão sobre determinados assuntos e interesses, também podem dar-se as mãos para uma mύtua defesa. A razão é simples: sempre nos termos de Noel Clarasό, não raro um verdadeiro estadista se transforma em polίtico/politiqueiro no ato de ser eleito e tomar posse do mandato. Mais difίcilé a metamorfose em sentido inverso, isto é, de polίtico/politiqueiro ao verdadeiro polίtico/estadista.